sábado, 24 de abril de 2010

Da minha viagem a Portugal


O que mais me incomoda nas religiões é a falta de religião delas. Muito comércio, muito cenário, pouca elevação.E essa obsessão por impor uma fé inabalável que tenta subtrair o nosso direito de duvidar. "Duvido,portanto penso", já disse o poeta português. Duvidar é um dom,um sinal da inteligência. E isto pode ser sagrado. Agir como tolo e tentar minimizar a complexidade do universo não pode ser algo sagrado.
Nossa Senhora de Fátima apareceu para três pastorinhos, contaram-me os fiéis a caminho do santuário,com tanta certeza como se tivessem também visto. Será mesmo?Como sabem? Então crianças não fantasiam? Não mentem? Não podem nem mesmo ter ilusões de optica? O que pretendia Nossa Senhora de Fátima ao aparecer numa árvore aos pequenos Jacinta, Francisco e Lúcia? Pensava eu só comigo. Não pude perguntar ou apenas compartilhar meus questionamentos sem ofender os cristãos presentes. Pensar é feio. Deve ser pecado.
Mais emocionante foi, ainda no mesmo país, conhecer o túmulo de Fernando Pessoa no belíssimo Mosteiro dos Jerônimos. Quase me senti uma peregrina como os católicos em Fátima. Que minha devoção seja pela arte, sensibilidade, talento, criatividade, pela inteligência humana acima de todas as coisas. Que se construa um santuário para Fernando Pessoa! E então, só assim, poderão chamar-me religiosa.


"A certeza, isto é, a confiança no caráter objetivo das nossas percepções, e na conformidade das nossas idéias com a realidade ou a verdade, é um sintoma de ignorância ou de loucura. O homem mentalmente são não está certo de nada,isto é,vive numa incerteza mental constante; quer dizer, numa instabilidade mental permanente; e, como a instabilidade mental permanente é um sintoma mórbido, o homem são é um homem doente."

Fernando Pessoa - Idéias Filosóficas

domingo, 11 de abril de 2010

No Meu Universo Particular

Às vezes me dá uma preguiça de viver. Vontade de me ajeitar no quentinho da cama até o dia amanhecer. Por dentro brigo com dragões e anjos. Lá fora é só o São Paulo contra o Santos. Fecho os olhos. Sou eu, ele, um castelo e um cabernet. Abro os olhos. Só eu, ele, uma itaipava e a tv. No meu mundo ele me chama de meu amor. Na minha orelha ele só grita, vamo tricolor!
Da janela vem um dia nublado. No meu leito é só o sol ardendo pelo meu corpo malhado. Tem gente que diz que o importante é viver.Mas nem sempre entendo para quê.
Por que me aprisionar nesse presente, se eu posso ser ainda mais feliz na minha mente.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Um Brinde ao Lado B

Foi um dia qualquer de chuva que me fez refletir sobre minha família. E uma sensação de gratidão invadiu minha alma. Meu pai sempre bebeu e fumou como se não houvesse amanhã. Além de pregar aos quatro ventos que criança precisa apanhar para aprender. Minha mãe nunca preocupou-se com alimentações equilibradas. Meu avô falava a verdade sem limites. Muitas vezes atingindo os sentimentos alheios como uma metralhadora. Já minha avó ensinou-me que o importante mesmo é alegrar os outros. Pode-se mentir deslavadamente desde que se mantenha o interlocutor agradado. Fora os outros integrantes como tios que orgulhavam-se de feitos como votar no maluf e ganhar dinheiro no pôquer. Que tempos bons!Quantas lições! E, acreditem, eu não estou sendo irônica. Que educação boa que eu tive!Todos livraram-me do politicamente correto. Algo raro nos tempos atuais. Hoje só vejo pais ensinando seus filhos a praticar exercícios regulares, a respeitar e ouvir os outros, a comer menos colesterol. Adultos que não pronunciam palavrões na presença dos menores. Lições de ecologia, fraternidade e igualdade por todos os minutos do dia! Crianças aprisionadas entre os limites do certinho e do corretíssimo. Tolices! Contem-me uma piada racista! Digam-me algo execrável, sem sentido, inaceitável! Mostrem-me atitudes injustas preenchidas de sentimentos humanos deploráveis! Qualquer coisa desde que me libertem do politicamente chato. Salvem nossas crianças!
Graças a minha família solidifiquei em mim aquele que se não for o maior, com certeza é o mais verdadeiro dos ensinamentos. O de que o ser humano é dotado de fraquezas, vícios, imperfeições. É falho. Ainda bem! Só algo totalmente correto pode ser mais tedioso que esse esvaziado dia de chuva.